"Nasceu em 10 de abril de 1860, no Rio de Janeiro (RJ). Maria
Augusta era filha de Maria Luísa Estrela e do comerciante Albino Augusto
Generoso Estrela, portugueses. O pai, representante comercial de laboratório
farmacêutico, propiciou-lhe educação exemplar e sempre a apoiou em suas
iniciativas. Recebeu a educação elementar no colégio de Madame Gross, destinado
a moças, que funcionava no bairro de Laranjeiras (RI).
Ingressou no Colégio Brasileiro
como aluna interna. Ali pôde amadurecer a ideia de estudar medicina. Contudo,
ainda eram fechadas às mulheres as portas das faculdades no Brasil, o que não a
impediu mais tarde de se tornar a primeira médica brasileira.
Em março de 1875, partiu para os Estados Unidos a fim de
frequentar o curso preparatório para a escola de medicina, na Academia ST.
Louis, em Oswego, transferindo-se depois para o colégio Mease, na cidade de
Nova York. No dia 8 de setembro de 1876, com 16 anos, matriculou-se na New York
Medical College and Hospital for Women, uma faculdade de medicina
exclusivamente voltada para mulheres. A banca de seleção da escola não quis
aceitar sua matrícula, alegando que ela não tinha a idade mínima para cursar a
faculdade. Maria Augusta argumentou com os examinadores que dispunha dos
requisitos intelectuais necessários para realizar o curso, apesar da pouca
idade. Foi convincente e fez os exames preparatórios no dia 16 de outubro e,
aprovada, matriculou-se. Seu pai, que a acompanhava, deixou-a aos cuidados de
uma das professoras da escola e sob a responsabilidade legal do cônsul
brasileiro em Nova York.
A imprensa brasileira acompanhou-lhe todos os passos desde a
sua partida do Rio de Janeiro. Publicadas como folhetins, ao longo de todos os
cinco anos em que esteve fora do país, as notícias relativas a Maria Augusta
constituem um capítulo de sua biografia. Doenças passageiras, notas no dia do
seu aniversário, tudo era assunto nos jornais da Corte, de Pernambuco e, em
particular, da Bahia. Nem bem Maria Augusta se matriculara na escola em Nova
York, os articulistas brasileiros já anunciavam que ela iria se dedicar
"exclusivamente a doenças de senhoras e de crianças". A idéia de que
a especialidade da futura médica deveria acompanhar a "natureza"
feminina foi recorrente na cobertura jornalísticas. Até as cartas que ela
escrevia ao pai foram, sistematicamente, publicadas.
Em fevereiro de 1878, o escritor baiano Belarmino Barreto
editou uma biografia de Maria Augusta, ilustrada com retratos da jovem
"futura doutora". A imprensa de todo o país saudou a publicação e
recomendou a leitura às moças brasileiras, para que se mirassem no seu exemplo
de determinação e brilhantismo.
Quando já estava adaptada aos Estados Unidos, à língua
inglesa e às exigências do curso, seu pai sofreu um revés nos negócios que o
impossibilitou de continuar arcando com os custos de seus estudos no exterior.
Restou ao senhor Albino Estrela apelar para o imperador D. Pedro II, que
acolheu o pedido e, por meio de decreto, concedeu a Maria Augusta uma mesada em
dólares, equivalente a 100 mil réis e uma quantia anual equivalente a 300 mil
réis, destinada a vestuário. Através do corpo diplomático, o imperador ficou
sabendo, ao final de 1877, que a agraciada continuava a mostrar-se merecedora
da proteção imperial. Ao longo de 1879, as despesas se avolumaram e o pai de
Maria Augusta recebeu a ajuda de respeitável quantia do fazendeiro fluminense
Augusto César de Oliveira Roxo. No início de 1880, um grupo de nobres e
comerciantes de destaque no Rio de Janeiro reuniu a quantia de dois contos e
quinhentos e cinqüenta mil réis, a título de contribuição extraordinária. O
grupo foi organizado pelo barão e baronesa do Bonfim. Nova ajuda veio em junho de 1880, quando o
visconde de Sapucaia decidiu doar uma quantia mensal a seu pai. Foi
providencial, já que Maria Augusta havia cortado a mão com um bisturi quando
realizava uma autópsia. O ferimento inflamou e, numa época em que ainda não
havia antibióticos, a recuperação foi penosa. Mais uma vez, Maria Augusta
ocupou a imprensa, que noticiava os gestos generosos dos membros da elite
brasileira e a evolução do estado de saúde da futura médica. Em agosto de 1880,
Albino Augusto faleceu sem ver a filha formada. Maria Augusta permaneceu nos
Estados Unidos, trabalhando arduamente para concluir o último ano do curso. Em
janeiro de 1881, deu vazão ao seu talento como jornalista, ensaiando os
primeiros passos na defesa de idéias sobre a emancipação da mulher. Publicou,
juntamente com sua colega de curso, a pernambucana Josefa Agueda F. Mercedes de
Oliveira, o jornal A mulher, que se anunciava como "um periódico ilustrado
de literatura e belas-artes, consagrado aos interesses e aos direitos da mulher
brasileira". Redigido em Nova York, o periódico era distribuído para as
redações dos principais jornais brasileiros. A iniciativa das duas estudantes
chegou a ser noticiada na imprensa
norte-americana.
No ano seguinte, recebeu o seu diploma de médica, mas
permaneceu em Nova York por mais um ano, sob o patrocínio do imperador, para se
aperfeiçoar. Consta dos documentos pessoais de D. Pedro Il uma carta enviada no
início de 1882 por Maria Augusta em agradecimento aos benefícios recebidos.
O reconhecimento profissional de Maria Augusta Estrela, bem
como a repercussão de seu caso na imprensa, foram responsáveis pela pressão da
sociedade sobre o poder público para alterar os critérios de ingresso nos
cursos superiores. Uma reforma do ensino, aprovada no parlamento em 1879,
permitiu finalmente a matrícula de mulheres nas faculdades. Em 1881,
matricularam-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro Ambrosina Magalhães,
Augusta Castelões, que não concluíram o curso, além de Rita Lobato Lopes, que
iniciou os estudos na mesma instituição, em 1884 e, transferiu-se posteriormente
para a Faculdade da Bahia, onde se formou.
No dia 10 de novembro de 1882, Maria Augusta desembarcou no
Rio de Janeiro e foi recebida calorosamente por amigos e pela família. Em 1884,
casou-se com o farmacêutico Antônio da Costa Moraes , com quem teve quatro
filhos. Ele era proprietário da Farmácia Norma, situada na Rua da Quitanda,
centro do Rio de Janeiro, onde Maria Augusta exerceu a clínica médica por
muitos anos. Maria Augusta faleceu no Rio de Janeiro em 18 de abril de 1946,
aos 86 anos. Em meados da década de 1980, a Prefeitura e a Câmara Municipal do
Rio de Janeiro deram o nome de Maria Augusta Generoso Estrela ao Centro
Municipal de Saúde de Vila Isabel. Pouco tempo depois, o bairro de Bangu
homenage-ou-a dando seu nome a uma avenida."
Organizado por Schuma Schumaer e Érico Vital Brazil
Jornal O Cruzeiro
Rio de Janeiro, Sexta-Feira 23 de Agosto de 1878.
“Nas lojas dos Srs. Catilina & Lefevre, está à venda a linda biografia da distinta futura médica brasileira, a Exma. Sra. D. Maria Augusta Generoso Estrella, a primeira de nosso país, na ciência, que abraçou em tão tenra idade, da qual o público já tem conhecimento da sua elevada inteligência e vocação para a medicina, proclamada já pela imprensa da cidade de Nova York nos Estados Unidos, e por toda a do seu país, como uma das primeiras glórias brasileiras no sexo feminino.
Dela é sua Majestade o Imperador do Brasil o admirador e protetor, como a imprensa o tem publicado, pela ciência que tem do fato.
Essa linda biografia é digna de ser lida por todos, e muito principalmente pelas nossas patrícias, que devem orgulhar-se daquela que tanto se tem distinguido desde menina, para um dia poder ser útil ao seu sexo, na humanitária missão para que Deus a escolheu e destinou.
Sua biografia tem episódios tão tocantes e sentimentos desde a idade de 12 anos, até àquela em que se matriculou na faculdade de medicina, para senhoras em Nova York, que fazem correr as lágrimas a todas as pessoas que a ler: principalmente sobre o naufrágio por que ela já passou com seu bom pai no vapor inglês Flamsteed em Novembro de 1873, vindo da Europa para o Rio de Janeiro.
Na vidraça da loja dos Srs. Catilina & C. está um quadro com a fotografia da Exma. Sra. D. Maria Augusta Generoso Estrella, tirado em Nova York um mês depois de matriculada na faculdade de medicina naquela cidade; tendo então 15 anos e sete meses de idade.
No mesmo quadro vê-se uma outra fotografia em ponto pequeno representando-a vestida de marinheiro como quando ela desembarcou no Rio de Janeiro, promessa que fez à Nossa Senhora das Dores, sua madrinha, a bordo do vapor inglês Flamsteed; quando se deu o abalroamento com o vapor inglês de guerra Blorimphon, que, se todos se salvassem, saltaria em sua terra natal vestida naquele traje. Passadas algumas horas, submergia-se o vapor Flamsteed nas vastas águas do oceano, depois de todos estarem salvos a bordo do encouraçado Blorimphon.
Sua promessa foi cumprida rigorosamente, assim como seus rogos tinham subido ao céu. Lendo-se os episódios da sua biografia, é que se pode apreciar, sua coragem, heroísmo e talento”.
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