terça-feira, 4 de abril de 2023

Alzira Soriano - Primeira prefeita no Brasil e na América do Sul


Alzira Soriano foi a primeira mulher a ser eleita para um cargo executivo no país, quando se elegeu prefeita da cidade de Lajes, no Rio Grande do Norte, com 60% dos votos, no ano de 1928. O jornal norte-americano “The New York Times” inclusive a citou, à época, como a primeira prefeita eleita em toda a América Latina. Pioneira na participação feminina na política no Brasil, Alzira lutou pelo direito das mulheres brasileiras votarem e serem elegíveis – o voto feminino em todo o país só viria em 1932.
Alzira posteriormente teria ainda 3 mandatos como vereadora na cidade de Lajes.

O Rio Grande do Norte foi pioneiro ao dispor em 1926, em sua Lei Eleitoral, que "poderão votar e ser votados, sem distinção de sexo, todos os cidadãos que reunirem as condições exigidas por lei."

No dia 24 de fevereiro de 1932 foi instituído o Dia Nacional da Conquista do Voto Feminino porque somente nessa data, em 1932, as mulheres tiveram o direito ao voto assegurado em lei com o decreto 21.076 do então presidente Getúlio Vargas.

Fonte: Câmara Legislativa  

Alzira Soriano
Prefeita de Lajes - RN (1929–1930) - Mandato interrompido devido a revolução de 1930.
Nascimento: 29 de abril de 1896 Jardim de Angicos, Rio Grande do Norte
Falecimento: 28 de maio de 1963, Natal, Rio Grande do Norte


 Jornal O Globo - 13-06-1962

Jardim de Angicos deve muito à prefeita D. Alzira

Um pouco de reminiscências da primeira mulher a chefiar a prefeitura de uma cidade brasileira

Jardim de Angicos, naqueles tempos, era a cidade mais "politica" da região; desde que fora proclamada a República, ali nasciam movimentos que se estendiam por todo o Estado do Rio Grande do Norte. Foi em Angicos que nasceu D. Alzira Soriano e ela, desde pequenina tomava parte de reuniões políticas presididas pelo pai, ouvindo conversas difíceis sobre a República. Aos 17 anos ela se casa com o Juiz de Direito local, ficando viúva cinco anos após. Volta ao convívio da família prossegue ajudando o pai nas suas campanhas. E após trinta e dois anos vem a ser a primeira mulher Prefeita, não só do Brasil, mas de toda a América do Sul. Isto em 1929.

Pela Emancipação Feminina

Relembrando como começou o movimento de sua candidatura, D. Alzira Soriano recorda a visita da Dra. Berta Lutz ao seu município de Lajes, quando  liderava a campanha feminista que concedeu à mulher brasileira o direito de votar e ser votada.

- Ela chegou em Lajes acompanhada do Dr Lamartine, governador do nosso Estado - conta D. Alzira. E por receber plena ajuda do governo é que fez do Rio Grande do Norte o primeiro Estado brasileiro a efetivar esses direitos da mulher.

E porque Berta Lutz viu grandes possibilidades de ter em D. Alzira Soriano o exemplo vivo de que a mulher também podia governar, sugeriu ao Governador Lamartine que a convidasse a candidatar-se a Prefeitura de Lajes.

Foi uma parada difícil

Já havia dois outros candidatos. Correndo a notícia de que D. Alzira, vinha apoiada pelo Partido Republicano e pelo próprio pai, líder político da região, aqueles se retiraram da campanha.

- Acabei ganhando as eleições por unanimidade - diz ela. Foi uma festa geral, porque ninguém havia perdido nem a eleição nem o voto.

Jornais do mundo inteiro noticiaram o fato, D. Alzira foi muito festejada, o Governo rio-grandense o o da República se fizeram presentes à sua posse e a campanha feminista era vitoriosa em todo o País. Confiados ao critério das suas decisões, os encargos da administração do Município de Lajes. Tinha D. Alzira Soriano trinta e dois anos naquela época.

Deu tudo certo

Ela começou por "colocar a casa em ordem", Faltava tudo por fazer. Constituiu secretários. e como não havia nem escrita na Prefeitura, pediu logo auxílio no Governo do Estado, que mandou escriturários para orientar a sua organização.

- Arrecadava-se um total de 60 contos de réis - conta D. Alzira. E como dava para gastar! Abri nova estradas, construí mercados distritais, muitas escolas, estendi a rede de iluminação elétrica.

Fez muito por Jardim de Angicos, a sua terra natal, que até ganhou um jardim de verdade. Mas "a alegria durou pouco veio a Revolução de 30 ela perdeu a mandato. Voltou à vida caseira mas não perdeu a "mania da política"

Desde que voltaram a acontecer eleições no País D. Alzira é eleita vereadora, pela UDN. "E a luta é sempre a mesma - comenta. Por novas estradas, escolas, mais luz elétrica, assistência médica que o povo reclama".

Se gostaria de ser prefeita novamente? "Claro que sim, pela vontade do povo". Mas D. Alzira sente-se "velha e cansada" agora. Nós a sentimos uma mulher extraordinária, que passou vitoriosa pelos preconceitos da sua época, com uma inteligência que até hoje se mantém viva e privilegiada.

terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Enedina Alves Marques - Primeira Engenheira Civil negra do Brasil.

 

Enedina em sua formatura em 1945

ENEDINA ALVES MARQUES

(1913-1981)

Ana Crhistina Vanali

Enedina Alves Marques, negra e de família pobre, foi a primeira mulher a se formar na Faculdade de Engenharia do Paraná, tornando-se assim a primeira engenheira civil negra do Paraná e do Brasil.

Enedina, também conhecida como Dindinha, nasceu em Curitiba em 8 de janeiro de 1913. Filha de Paulo Marques e de Virgínia Alves Marques (Nhá Duca). Os pais se separaram quando ela ainda era criança. A mãe era lavadeira e durante a infância de Dindinha foi morar e trabalhar na casa da família Nascimento. O major e delegado de polícia Domingos Nascimento Sobrinho, patrão da mãe de Enedina, casado com Josephina do Nascimento Teixeira, foi o incentivador de seus estudos. Ela foi alfabetizada por volta dos 12 anos de idade na escola particular da professora Luiza Netto Correia de Freitas. Realizou o exame de proficiência e concluiu o curso primário no grupo escolar anexo à Escola Normal. Entre os anos de 1926 e 1931 fez o curso da Escola Normal Secundária juntamente com Isabel, a filha do major Domingos, que lhe pagou o bonde durante a formação como normalista para que fizesse companhia à filha. Durante toda essa fase da sua formação trabalhou como criada de servir e de babá para a família Nascimento.

No ano de 1932 iniciou sua carreira como professora da rede pública de ensino. Interrompeu seu trabalho de doméstica na casa da família Nascimento e seguiu para o interior do estado para atuar como professora no Grupo Escolar de São Mateus do Sul. Lecionou também no Grupo Escolar de Cerro Azul, no Grupo Escolar Barão de Antonina em Rio Negro, na Escola Isolada do Passaúna em Campo Largo. Retornou para Curitiba em 1935 e foi trabalhar na Escola da Linha de Tiro do Juvevê. O seu regresso à capital ocorreu para realizar o Curso de Madureza, exigência da nova legislação da Instrução Pública, que era um curso de capacitação profissional de três anos de duração para o exercício de professor. Nesse mesmo ano, para complementar seu rendimento abriu uma escola particular para crianças que não frequentavam a rede pública. Realizou o Curso de Madureza no Ginásio Novo Ateneu finalizando-o no ano de 1937. Um dos seus colegas de curso, Jota Caron, foi seu intermédio junto à família Caron com quem Enedina foi trabalhar e morar.

Entre 1938 e 1939 realizou o curso de pré-engenharia para prestar os exames de ingresso na Faculdade de Engenharia do Paraná. Nessa época, durante o dia trabalhava como professora e nos trabalhos domésticos da residência da família Caron. À noite frequentava o curso preparatório e nas madrugadas copiava a matéria dos livros que não tinha condições de adquirir e que emprestava dos colegas para estudar (SANTANA, 2013). Morou com essa família até o ano de 1954 quando se mudou para um apartamento no Edifício Tijucas no centro de Curitiba.

No ano de 1940 entrou para a Faculdade de Engenharia do Paraná. Alguns casos de perseguição, preconceito e discriminação que sofreu durante a realização do curso são relatados por pessoas que a conheceram e foram entrevistadas por Santana (2013). Formou-se engenheira em 1945 aos 32 anos de idade.

No ano seguinte a sua formatura, em 1946, Enedina começou a trabalhar na Secretaria de Viação e Obras Públicas do Paraná de onde saiu aposentada em 1962. Durante essa fase exerceu várias funções: foi chefe da seção de hidráulica, chefe da divisão de estatística, realizou o levantamento topográfico da Usina Capivari-Cachoeira, participou da construção da Usina Parigot de Souza, do Colégio Estadual do Paraná e da Casa do Estudante em Curitiba. Durante um tempo exerceu o serviço de engenharia da Secretaria de Educação e Cultura. Santana (2013) aponta que Enedina teve seu trabalho e capacidade técnica reconhecidos pelos governadores Moyses Lupion e Ney Braga, o que lhe permitiu construir uma rede de sociabilidades e receber uma compensação profissional através de decretos, dispositivos legais que revisaram a contagem de seu tempo de serviço e a sua remuneração, o que parece ter lhe garantido uma aposentadoria rentável.

Enedina faleceu em Curitiba, aos 68 anos, vítima de infarto no dia 20 de agosto de 1981, solteira e sem filhos. Está sepultada no Cemitério Municipal São Francisco de Paula, num túmulo mantido pelo Instituto de Engenharia do Paraná.

Em 2006, Enedina foi homenageada com a inscrição de seu nome sob o número 237 no Livro do Mérito do Sistema CONFEA/CREA", dedicado a lembrar profissionais falecidos por suas contribuições para a melhoria da qualidade de vida e progresso da sociedade¹s. Em 2013, ano do centenário do seu nascimento, sua memória foi recuperada por meio da publicação de várias reportagens dando conta da sua existência. As narrativas biográficas consultadas sobre Enedina procuram passar a imagem de alguém que venceu na vida pelo próprio esforço, que não se contentou com as "migalhas" que eram reservadas ao pobre, preto e mulher, saindo da invisibilidade. Desconhece-se que Enedina tenha feito odes feministas ou em prol da igualdade. Mesmo assim, se tornou uma popstar. Virou bandeira flamejante no movimento negro e objeto de estudos de gênero, mesmo que nos seus 68 anos de vida não tenha demonstrado simpatia por nenhuma das duas causas. Hoje, Enedina empresta seu nome para uma rua do bairro Vila Oficinas em Curitiba", está imortalizada ao lado de outras 53 pioneiras no Memorial à Mulher Pioneira do Paraná (inaugurado no ano 2000), batiza o Instituto de Mulheres Negras de Maringá (fundado em 2006), um centro municipal de educação infantil em Pinhais e o Coletivo Enedina dos estudantes afro- descendentes da UTFPR/Campus Curitiba (fundado em 2015). Tudo isso porque ela conseguiu transpor um espaço hegemonicamente elitizado, masculino e branco ao se diplomar em engenharia sendo pobre, mulher e negra.